Era música...
(Para leres, ouvindo A Transfiguração do amor, de Tristão e Isolda, de Wagner)
E então soprou um vento de ternura intensa.
E as nuvens se dispersaram, e eu vi que meu coração emergia como um alto cume de montanha, dourado de sol, musicado de pássaros e águas.
Olhava teus olhos, tuas mãos, teus cabelos, teu corpo...
Teu corpo era como um caminho sinuoso por onde saí
desesperado a procurar-te.
E, de repente, tomei-te nos braços, afaguei-te a cintura,
recolhi-te ao meu peito.
Teu coração inquieto pulsava mais que o córrego das montanhas,
batia asas de pássaro encandeado.
E de repente saímos livres e felizes, como simples animais de Deus com a direção dos ventos.
Faminto, colhi-te como um fruto!
Sedento, bebi-te como a água!
Marquei meus dentes em tua carne e escorreste pela minha boca, pelo meu pescoço, pelo meu peito.
Meus braços foram tuas formas.
Minhas mãos te conheceram.
Desmanchei-te os cabelos, e me perdi.
Nossas bocas se uniram, e se esqueceram.
Tatearam meus lábios escalando cumes, devassando vales.
E fiquei em ti, vivo e silencioso, como o sangue nas veias, como a seiva na raiz.
E desci sobre ti e me entranhei, como a chuva descendo e molhando.
E quando falamos: era música.
Toda vez que nos despedimos
Toda vez
Há um mundo de ternura em teus olhos, um mundo estranho e profundo,
Como os reflexos da luz no vinho que ficou no fundo
De duas taças após a embriaguez
(JG)